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terça-feira, 29 de setembro de 2009

Depoimento sobre o Gestar II - pela cursista Sandra C. Tombini

O Brasil vive uma realidade assustadora: alunos chegam ao nono ano sem saberem entender os sentidos de um texto ou construí-lo. Isso é reflexo de uma série de fatores, mas prefiro não me estender nesta questão. Quero, como cursista do Gestar II e como professora de Língua Portuguesa e de Literatura da Rede Pública de Carazinho, tratar da questão do ensino de língua, questão tão trabalhada em nosso curso.
O nosso contexto conta com muitos profissionais que atuam no ensino de língua materna pautados numa linguística tradicional, entendendo que ensinar subdivisões de classes gramaticais e/ou fazer a análise sintática de uma frase é o essencial para que se aprenda uma língua. Muitos são relutantes em admitir que a língua não é estanque; outros enxergam as mudanças, mas não acham tempo, ou muitas vezes, recursos financeiros para realizarem uma formação continuada na área que atuam. Há ainda colegas bem mais experientes na profissão, que possuem uma bagagem enorme e, inquestionavelmente, muito valiosa, que se questionam sobre esse "novo jeito de ensinar português".
Amo diferentes linguagens, tanto que já fui cantora de coral e de festivais escolares, pianista, já fiz teatro, já quis ser fonoaudióloga, jornalista, amo cinema, música e literatura, principalmente o nosso Cosme Velho, Machado de Assis. Na adolescência, viajei à ilha de Paquetá através de "A Moreninha", local que, posteriomente, conheci "literalmente".
Sou uma professora que ao iniciar, quase desisti da profissão. Os subsídios que a faculdade me dera não me eram suficientes para chamar a atenção de turmas lotadas e cheias de problemas extraescolares(drogas, violência doméstica,fome etc.) que eu também tinha de enfrentar. Mas como sempre gostei de tudo que envolvesse diferentes linguagens e era concursada, resolvi ficar, mas eu não me acostumei...eu me preparei e ainda me preparo...
Preparei-me conhecendo teorias que surgiram a partir da linguística textual, chegando ao seguinte veredicto: decorar normas não é suficiente para que o aluno atue com e sobre a língua eficazmente, pois mesmo conhecendo todas elas, ele pode não ter domínio de compreensão e de produção textual de gêneros distintos.
Não quero afirmar que o conhecimento de gramática não é importante( algo que é muito mal compreendido por muitos professores que afirmam abolir a gramática), pois não podemos ler, escrever, ouvir ou falar sem que conheçamos a estrutura linguistica. O que quero frisar é que o ensino da nomenclatura não é suficiente, visto que para construir os sentidos de um texto, seja através da leitura ou da escrita, há necessidade de que se conheça a língua em uso, percebendo o seu funcionamento e os efeitos de sentido produzidos por ela. As aulas de língua devem trabalhar com fatos linguísticos, percebendo a língua como ela realmente acontece. Os manuais de gramática trazem apenas a norma perfeita, não levando em consideração que a línguagem não é homogênea.
Drummond no século passado disse que "Há uma pedra no meio do caminho". A linguista Irandé Antunes(2007) parafraseou a expressão e disse "Há uma pedra no caminho nas aulas de língua portuguesa". No livro "Aula de Português" sugere que os professores devam interessar-se em “ouvir” e “ver” sua língua acontecendo: nas conversas, nos debates, nos sermões, nos jornais, nas revistas, nos livros etc, analisando o que se diz, como se diz para demonstrar como realmente a língua funciona. Eis aí a proposta do Gestar II. Assim, tanto os professores quanto os alunos podem transformar-se em observadores da língua, podendo passar a discutir os efeitos de sentido construídos com a língua e tornarem-se juntos pesquisadores fazendo um estudo contextualizado da mesma, adquirindo tanto competência linguística como comunicativa.
O programa Gestar II é um programa de formação continuada - diferente dos programas de formação ministrados pela rede municipal - que vem ao encontro do estudo da língua de forma contextualizada auxiliando os professores a tirarem as pedras do meio do caminho de suas aulas. O material é excelente, trabalha o texto enquanto efeito de sentido entre/para interlocutores. Considera a língua não homogênea, translúcida, mas como heterogênea e opaca, já que dentro de um enunciado emergem diferentes vozes,significados distintos.
Os encontros são bons, há troca de material, de experiências.... onde nós, as professoras de língua, temos um momento para refletirmos sobre o idioma, não apenas como exercício de metalinguistica, mas contruindo reflexões, inferindo significados, construindo saberes necessários a nossa prática. Há também tempo de tomarmos nosso café, interagirmos sobre as aulas, mostrar nossos ganhos e também "chorar" pelas nossas perdas. Cada turma reage diferentemente às atividades. Uns aproveitam, outros nem tanto... Mas pelo menos alguns já ganharam.
O interessante do nosso grupo é que todos estão lá para aprender. Eu mesma, quase mestre em Linguistica, sei que pouco sei... Já retomei várias teorias, aprendi como aplicá-las, tranformando o conhecimento acadêmico, tão estanque, no uso na sala de aula, a partir dos materiais trabalhados. As colegas mais jovens na profissão, como eu, aprendem com as mais experientes, as mais experientes aprendem com as mais jovens. Todos tem a ganhar.
Temos de fazer nossos alunos amarrar os fios que estão dispersos no dicurso, fazendo uma rede em que um sentido convoque outros. Fazer com que leiam as diferentes ideologias que atravessam os textos, observando as relações de poder envolvidas. Assim, prepararemos nossas crianças para uma vida em que ler e escrever é simplesmente um "tudo" em suas relações sociais. Mas para tanto temos de estar preparados. Isso somente acontece com muito estudo e empenho. Vamos então à segunda fase do Gestar.

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